sexta-feira, 22 de maio de 2009


Alegres e tristes


Manuel Alegre sempre foi uma surpresa para mim sobretudo pelo valor simbólico que ainda possui. É um símbolo da minha geração. Mas de quê? Ao certo não sei bem. Como é que a história o irá recordar? Quando penso nisto apenas vejo lutador e panfletário. É um lutador que teve sempre uma sala para falar. A sala já lá estava e ele aproveitou-a. Não a fez. Aproveitou-a para falar de sentimentos, de estados de espírito e dores de alma. Coisas eternas e sempre nossas.

Olhando para trás verifico que por esses dias o Reich do “Escuta Zé ninguém” marcou a minha maneira de pensar e ser. A “Praça da Canção” conduziu-me à sonolência. Como todos os agitadores desses tempos quando teve de exercer o poder no dia a dia fez asneiras atrás de asneiras. Enquanto agitador pelejou pela democracia e liberdade de expressão contra a ditadura e o pensamento controlado. Enquanto poder exerceu a ordem como é habitual. Pôs uns, tirou outros e ficou sem saber o que lá andava a fazer. Baralhou-se totalmente. Não gostou muito de ser contrariado nem de grandes discussões. Não conseguiu a unidade nem o diálogo mas isso não o preocupou muito. Claro que ficou mais que evidente que Alegre não conhece os caminhos para onde quer ir e quem for com ele perde-se.

Nunca lhe conheci um pensamento político claro e creio que não o tem. Tinha espaços para falar, tinha lideres a conduzir e que ditavam os caminhos e também a divisão de tarefas diárias. Quando se propôs candidato a Presidente com o seu mentor de sempre, Soares, verifiquei o que sempre foi evidente: é um político sem ideias para os tempos presentes e, claramente, um homem do passado. Entristeceu-me tudo aquilo. Surpreendeu-me a falta de lucidez, de capacidade de liderar e de qualidades politicas vitais. Vive de impulsos e ideias de outros. Acima de tudo parece estar sempre sentado entre duas cadeiras. Não está sentado em nenhuma e acaba por cair. E acaba por fazer cair os outros, deixá-los mal vistos, ter de pedir desculpa, sair pela porta do fundo a ameaçar que regressa.

Apesar de não esperar outra coisa tudo isto me entristeceu. Os símbolos com pés de barro não duram muito é um facto. A pouco e pouco estas gerações de símbolos vão desaparecendo e dando lugar à geração de homens comuns. Afinal é a ficção a ceder o espaço à realidade. Podem gritar que hoje já não há homens como antes, homens de verdade. Fico um pouco triste e ele continua Alegre. Embora eu preferisse ficar alegre e ele um símbolo com substância, não gosto de viver no engano. Prefiro estes tempos com estes homens de agora olhando para o futuro com uma insuportável angustia como sempre aconteceu ao longo da história do que as certezas dos amanhãs que cantam e de paraísos a quem lá chegar. Afinal são só trovas no vento que passa.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Marcelito e os 10 milhões de analistas
Não há tema, ideia ou decisão sobre a qual não tenham uma opinião bem sedimentada.Ligamos o rádio e eles lá estão. Sim senhor Manel Acácio? Queria cumprimentar todo o auditório….. a minha opinião é esta. 3 minutos a ouvir estes fóruns, uma visita ao futebol uma vez por ano e temos um panorama claro da evolução em Portugal. Como se fosse um programa de discos pedidos. Milhões de marcelitos comentam o dia a dia e todas as decisões com um à vontade incrível:
-“ … este governo só faz disparates. Esse engº que não é engenheiro pensa ..”
-“ …eles só querem é o nossos dinheiro para se passearem em grandes carrões na marginal e não fazerem nada”.-
“… se fosse eu acabava com os políticos todos.”-
“… nós já não temos políticos de verdade nem dirigentes de verdade”
Ainda um dia pensei em coleccionar os disparates que são ditos, mas felizmente desisti. A profundidade das análises é alarmante. O conhecimento que as pessoas têm dos assuntos que comentam é interessante. Ninguém sabe verdadeiramente do que se trata mas dos interesses que afecta ou das benesses que não confere. Estes novos marcelitos são uma praga endémica das rádios ditas participativas. Marcelo criou uma praga.
Não quero mais ouvir esta gente. Estou farto deles. Agarram-se ao telefone com desespero para alguns segundos de glória e bota baixo. Estou farto daquela energia negra “se fosse eu a mandar acabava com estes partidos todos”. De todo aquele autoritarismo e conversa alarve.
Em que escola terão aprendido? Que mestres tiveram para chegar aqui? Bem a verdade é que os debates mensais com o Governo na Assembleia, o falatório ali produzido nesses vazios momentos são muito semelhantes embora umas centésimas mais elevado. Reproduzem-se como coelhos, crescem, fazem poses de humilhados e ofendidos para a rádio, falam, falam mas não dizem nada. Pura alarvice.
Existe entre a nossa gente uma incultura horripilante. Interesses rasteiros e oportunistas pululam por todo o lado. Este povo tem cada vez menos interesse.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Um bicho amigo.

O Ferreira Fernandes é jornalista e escreve no DN. Não o conheço nem nunca o vi. Mas gosto muito dele. Acho que é cá dos meus. Olha para as coisas, pensa um pouco, vai buscar os seus arquivos, confere, duvida e escreve todos os dias uma coisa diferente. É um bicho todo cheio de rotinas mas que pensa e procura um pouco de sanidade neste beco insalubre. Estou com ele todos os dias. Na leitura claro. É um mestre. Como mestre usa a memória e excita os neurónios e obriga-me a ser diferente também. Agora o DN tem um novo site, melhorzinho, mais actual e completo. Até dá a alguns leitores a oportunidade de comentar (!!!) opiniões expressas e o Ferreira Fernandes não escapa ao estilo boçal e caceteiro dos grunhos habituais. A ferrugem está em todo o lado, destrói e banaliza. Troca seringas, bate na avó, cospe no cão e transforma tudo num arraial anarca com tasca aberta. Mas porque é que me chateei com isto?

Todo o homem honrado que procura fazer bem o seu trabalho merece o meu respeito. Gostaria de viver num mundo onde todos os Ferreira Fernandes fossem apreciados pelo que fazem e da forma como o fazem. Por outro lado uma democracia sem critica não é nada apenas um mero sistema por votação e sem conteúdo fervoroso. Todos têm o direito de falar, criticar e de se insurgirem. De gente calada e sem opinião já tivemos de sobra. Mas o que é que me chateou?

Será que só deveriam publicar opiniões científicas, bem informadas ou dadas por quem sabe? E onde estão essas coisas? Existem mesmo? Quando era jovem tanto me falaram do socialismo científico que fiquei a odiar todo e qualquer técnico. Ainda hoje penso que a filosofia e a politica comandam a vida. Devemos pois defender a biodiversidade. E o Ferreira Fernandes também para não se extinguir um dos raros exemplares onde podemos observar as razões de Darwin.
Deu-me na veneta para criar um blogue. Perguntou-me a Inês: como é que vais chamar ao teu blogue? Bicho do Mato. Porquê. Porque sou um bicho incerto, desarticulado e fugidio. É isso mesmo. Por cada dia que mourejo por aqui mais viro bicho matreiro, desconfiado e calejado. Da minha toca já vi muita coisa e já me canso de ver coisas. E quando tenho de vê-las arremelgo os olhos, penso um pouco e pergunto: será mesmo assim? Eriçam-se-me todos os pêlos pelas coisas mais insignificantes. Zango-me com coisas que oiço e não quero ouvir. Frases feitas, ideias sem nexo, gente inculta, palermas engravatados. Neste país toda a gente tem opinião sobre tudo, por vezes possuem mesmo 2 ou 3 opiniões sobre a mesma coisa, contraditórias e nem com eles mesmo estão de acordo. Portanto sou um bicho do mato, não gosto de confusões (nem de demasiada ordem), gosto do meu canto, dos meus frutos secos e de uma bebidazinha.
Já palmilhei muita estrada, muito monte e aglomerado. Já vi muitos povos, outras vidas e guerras. Sou de gente simplória e emigrante, do Alentejo e do sul. Já plantei árvores, escrevi livros e tive filhos. Vi morrer avós, tios e primos. Outros morreram-me estando vivos.

Como todos os bichos do mato sou curioso, atento e desafiador. E por vezes meto-me em alhadas que me espevitam por inteiro e me aquecem o sangue. Nunca quis ser conservador, retrógrado e desfasado dos tempos que construímos. Dou-me bem com algumas modernices mas detesto dependências. Odeio comportamentos estudados, certinhos e alarves. Passo bem sem muitas pessoas, muitas rotinas e obrigações.

Mas então o que é que me deu para criar um blogue? Creio que a necessidade de por cá fora outra forma de ver coisas de forma natural e de acordo comigo.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Abre brevemente.