quarta-feira, 15 de abril de 2009

Um bicho amigo.

O Ferreira Fernandes é jornalista e escreve no DN. Não o conheço nem nunca o vi. Mas gosto muito dele. Acho que é cá dos meus. Olha para as coisas, pensa um pouco, vai buscar os seus arquivos, confere, duvida e escreve todos os dias uma coisa diferente. É um bicho todo cheio de rotinas mas que pensa e procura um pouco de sanidade neste beco insalubre. Estou com ele todos os dias. Na leitura claro. É um mestre. Como mestre usa a memória e excita os neurónios e obriga-me a ser diferente também. Agora o DN tem um novo site, melhorzinho, mais actual e completo. Até dá a alguns leitores a oportunidade de comentar (!!!) opiniões expressas e o Ferreira Fernandes não escapa ao estilo boçal e caceteiro dos grunhos habituais. A ferrugem está em todo o lado, destrói e banaliza. Troca seringas, bate na avó, cospe no cão e transforma tudo num arraial anarca com tasca aberta. Mas porque é que me chateei com isto?

Todo o homem honrado que procura fazer bem o seu trabalho merece o meu respeito. Gostaria de viver num mundo onde todos os Ferreira Fernandes fossem apreciados pelo que fazem e da forma como o fazem. Por outro lado uma democracia sem critica não é nada apenas um mero sistema por votação e sem conteúdo fervoroso. Todos têm o direito de falar, criticar e de se insurgirem. De gente calada e sem opinião já tivemos de sobra. Mas o que é que me chateou?

Será que só deveriam publicar opiniões científicas, bem informadas ou dadas por quem sabe? E onde estão essas coisas? Existem mesmo? Quando era jovem tanto me falaram do socialismo científico que fiquei a odiar todo e qualquer técnico. Ainda hoje penso que a filosofia e a politica comandam a vida. Devemos pois defender a biodiversidade. E o Ferreira Fernandes também para não se extinguir um dos raros exemplares onde podemos observar as razões de Darwin.
Deu-me na veneta para criar um blogue. Perguntou-me a Inês: como é que vais chamar ao teu blogue? Bicho do Mato. Porquê. Porque sou um bicho incerto, desarticulado e fugidio. É isso mesmo. Por cada dia que mourejo por aqui mais viro bicho matreiro, desconfiado e calejado. Da minha toca já vi muita coisa e já me canso de ver coisas. E quando tenho de vê-las arremelgo os olhos, penso um pouco e pergunto: será mesmo assim? Eriçam-se-me todos os pêlos pelas coisas mais insignificantes. Zango-me com coisas que oiço e não quero ouvir. Frases feitas, ideias sem nexo, gente inculta, palermas engravatados. Neste país toda a gente tem opinião sobre tudo, por vezes possuem mesmo 2 ou 3 opiniões sobre a mesma coisa, contraditórias e nem com eles mesmo estão de acordo. Portanto sou um bicho do mato, não gosto de confusões (nem de demasiada ordem), gosto do meu canto, dos meus frutos secos e de uma bebidazinha.
Já palmilhei muita estrada, muito monte e aglomerado. Já vi muitos povos, outras vidas e guerras. Sou de gente simplória e emigrante, do Alentejo e do sul. Já plantei árvores, escrevi livros e tive filhos. Vi morrer avós, tios e primos. Outros morreram-me estando vivos.

Como todos os bichos do mato sou curioso, atento e desafiador. E por vezes meto-me em alhadas que me espevitam por inteiro e me aquecem o sangue. Nunca quis ser conservador, retrógrado e desfasado dos tempos que construímos. Dou-me bem com algumas modernices mas detesto dependências. Odeio comportamentos estudados, certinhos e alarves. Passo bem sem muitas pessoas, muitas rotinas e obrigações.

Mas então o que é que me deu para criar um blogue? Creio que a necessidade de por cá fora outra forma de ver coisas de forma natural e de acordo comigo.